AQUELE DIA, EM DARKWOOD!
Quando, no longínquo ano de 1957, apus minha assinatura como diretor da pequena Editora Audace, eu vivia feliz aquele tarefa que me permitia frequentar os mais famosos autores daquela época. Realmente, o nosso minúsculo lugar hospedava roteiristas como meu pai Gianluigi Bonelli, Andrea Lavezzolo, Roy D'Amy, Gino D'Antonio e outros ainda. Eu tinha a possibilidade de discutir com eles (pelo menos em linhas gerais) os projetos para as novas séries, de ler seus roteiros antes de enviá-los aos desenhistas escolhidos e também de mudar algumas frase que para mim, na condição de primeiro leitor resultassem pouco claras. Fascinado pela sua experiência e personalidade, nunca me passou pela cabeça, creiam-me, a ideia de poder, em qualquer época, realizar o serviço deles.
Dentro de mim não se era aceso ainda o sagrado fogo de narrador, embora, em 1958, eu tivesse feito uma tímida tentativa: cúmplice de um amigo desenhista, Franco Bignotti, eu escrevi uma coleção de western, que se intitulava "Um jovem no Faroeste", mas alguns números já foram suficientes para confirmar a minha convicção de "não estar à altura" como inventor de histórias.
Um Jovem no Faroeste, a "criação" em quadrinhos de Guido Nolitta que precedeu Zagor, na recente reedição das Edizioni If (desenho de Franco Bignotti).
G.L. Bonelli, pai compreeensivo e argumentista inspirado e incansável, aceitou continuar a série. Eu ainda não cria que havia conseguido liberar-me daquele empenho que ameaçava tornar-se uma espécie de pesadelo e, por três anos, limitei-me a julgar apenas o trabalho dos outros.
Zagor e Chico, simbolicamente em marcha pelos vastos territórios da Aventura (desenho de Gallieno Ferri).
Um dia, porém, em 1960, bateu à porta da Editora um desenhista do qual eu nunca tinha ouvido falar: chamava-se Gallieno Ferri e, embora fosse desconhecido na Itália, era muito conhecido na França, com o pseudônimo de Fergal. Ele havia desenhado para editores franceses, que depois se tornaram meus amigos, entre 1948 e 1960, além de outras coisas, as histórias do Fantasma Verde, Fantax e Maskar e os western Piuma Rossa, Kid Colorado e Jim Puma.
O seu estilo? Bem, imediatamente após o fim da Guerra, os desenhistas italianos não se envergonhavam em atribuir a sua inspiração aos mestres americanos dos anos trinta e, realmente, naquelas páginas que Ferri me mostrara, não me era difícil reconhecer a influência dos cartunistas americanos , como Alex Raymond (o autor de Flash Gordon), Ray Moore (Fantasma), Clarence Gray (Brick Bradford), Lyman Young (Cino e Franco), Burne Hogarth (Tarzan).
A sugestiva cabana de Zagor, situada na imaginária floresta de Darkwood (desenho de Gallieno Ferri).
O resultado tinha sua imediateza, uma agradável leitura, uma indiscutível eficácia, tanto que decidi não deixar sem seguimento aquele afortunado encontro. Depois de tê-lo feito ilustrar alguns episódios de "Giuba Rossa", escritos com a mesma disponibilidade pelo ocupadíssimo Bonelli pai, na falta de outros escritores, não tive alternativa: eu criaria um novo personagem que nos permitisse hospedar entre os nossos colaboradores fixos também o recém-chegado Gallieno Ferri que, àquela altura, havia renunciado à sua assinatura francesa de Fergal!
Justamente para distingui-lo de muitos outros protagonistas de séries de western que lotavam as bancas naqueles anos, decidi que o meu herói não seria um cavaleiro, mas sim um andarilho, um caminhante. Sim, vocês entenderam bem, estou falando de alguém que anda a pé, que atravessa planícies e florestas um passo após o outro, com a calma e a paciência de quem sabe mover-se em um mundo de dimensões relativamente limitadas. Forte Pitt? Uma andada de três dias. Aquele vilarejo? Pode-se dar um pulinho lá em quatro dias, contando ida e volta ao refúgio no pântano. A casa da família Smith? Bastava um giro de 90 graus e um dia e meio de bom passo!
A renúncia ao clássico meio de locomoção, o cavalo, sugeriu-me estudar um microcosmo pitoresco e variado, um pequeno mundo irreal, mas solidamente estabilizado, que deixasse ao alcance de um bom maratonista, como o meu novo personagem, as mais exóticas e fantasiosas aventuras: uma floresta intocável, injustificadamente cheia de cipós, de árvores e de temperaturas equatoriais, encravada misteriosamente entre as regiões do Ohio, da Pensilvânia e da Virgínia. Não a procurem nos mapas geográficos. Seu nome é Darkwood!
Sergio Bonelli
Capa da primeira revista da coleção Zenith Gigante, que reproduz as aventuras de Zagor, precedentemente lançadas no formato cheque (desenho de Gallieno Ferri).
Texto extraído da revista Zagor - Lo Spirito con la Scure, publicada por Oscar Mondadori, em junho de 2008, pág. V a XII.
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